No ano passado foram registradas mais de 223 mil notícias sobre crises corporativas ao redor do mundo. O cálculo é do Institute for Crisis Management, que vasculhou páginas, impressas e online, de quase 10 mil canais de notícias com foco em crise de reputação -- neste caso, definida como qualquer questão, problema ou perturbação que provoque reações negativas dos stakeholders e afete o desempenho empresarial.

Esse número é um indicador relevante de como as organizações estão cada vez mais expostas a situações de risco que podem comprometer sua reputações e/ou seus negócios. Devido a essa realidade, já se contam muitas empresas que, sabiamente, começaram a tratar prevenção de crise como algo a ser incorporado na sua cultura. São empresas em que a gestão de crise é considerada investimento no valioso ativo chamado reputação.

Mas há também o lado oposto, em que predomina a cegueira ou negação, principalmente, no comando da organização. Aqui são típicas as posturas de empresas que: 1 – acreditam que estarão eternamente imunes a acidentes ou tragédias – na suposição de que isso só ocorrerá com vizinhos ou concorrentes; 2 – que se limitam a ter o telefone de um bom escritório de advocacia ou de amigos no governo  – na crença de que o tratamento legalista é suficiente diante do tribunal da opinião pública, ou que sempre será possivel  encontrar um jeitinho à brasileira para resolver o problema; 3 – que confiam seu destino na força do sobrenatural, batendo com os nós dos dedos três vezes na madeira, como faziam povos primitivos.

Se essas práticas ocorrem é porque devem ter funcionado muitas vezes. E com base em tal experiência, há donos e dirigentes de empresas fortemente apegados a convicções moldadas no passado. Essa visão obsoleta talvez ajude a explicar o elevado número de 223 mil notícias sobre crises. Até porque, de acordo com o levantamente do Institute Crisis Management, menos de 26% das crises reportadas ocorreram repentinamente. Praticamente dois terços delas são relativas a situações de crises que eram latentes ou previsíveis -- ou seja, pelo menos algumas delas poderiam ter sido evitadas aplicando-se metodologias de prevenção.

O percentual desse tipo de crise vem crescendo justamente por causa da cegueira ou negação. É impulsionado por empresas em que a liderança não vê, ou se recusa a reconhecer, as mudanças ocorrendo num ritmo cada vez mais acelerado e a crescente influência dos stakeholders. O resultado é que não se preparam como deveriam e se tornam mais vulneráveis num cenário em que as situações de risco são potencializadas por fatores como, por exemplo, inovações tecnológicas, agressividade de grupos de pressão, avanço da criminalidade, novos marcos regulatórios, consumidores permanentemente conectados, instantaneidade da disseminação de imagens, fatos ou boatos e as polêmicas questões sobre gênero ou etnias.

Diante de tudo isso, de duas, uma: ou os empresários e executivos incluem a gestão de crise na sua estratégia de negócio, ou suas empresas são fortes candidatas a alimentar as estatísticas de crescimento de notícias sobre crise. Depende do legado que se pretende deixar: uma empresa admirada, com stakeholders engajados, preparada para enfrentar qualquer situação de crise, ou uma empresa cuja reputação depende do toc, toc, toc na madeira.