Porque A JBS não precisa ter medo das ameaças contra suas marcas.

Para quem perdeu quase R$ 10 bilhões de valor de mercado em apenas uma semana e já vinha sangrando desde março por causa do escândalo da Carne Fraca, a situação do grupo JBS não é tão confortável quanto a vida dos seus proprietários num apartamento de alguns milhões de dólares em Nova York. Além desta perda, Joesley e Wesley ainda precisam de livrar de uma fatura de R$ 11 bilhões exigida no acordo de leniência; estão na mira da CVM sob suspeita de operações ilegais no mercado acionário; e podem topar com outras sombras do passado, como a mal esclarecida aquisição do frigorifico Bertin.

Neste caminhar sobre brasas os reis do gado já enfrentam, também, ataques internautas propondo boicote não apenas de suas famosas marcas de carnes, mas de todas as demais marcas de produtos de empresas controladas pelo grupo, incluindo cosméticos, produtos de limpeza e até a venerada Havaianas.

Movimentos em redes sociais devem ser monitorados atentamente e, jamais, ignorados. Quando se fala de boicote de produtos, no entanto, é preciso considerar alguns aspectos. Engajamento total em chamados de boicote não faz parte da cultura do consumo nacional. Não há registro de empresas que tenham sido profundamente abaladas em função de movimento como este. Um chamado a boicote pode contar com adesão de consumidores mais facilmente quando existe apelo para se evitar algum risco para a saúde – e olha que a indústria de cigarro sobrevive apesar de campanhas da Organização Mundial de Saúde contra o tabagismo.

Chamados a boicote que não sejam fundamentados em falhas ou problemas específicos de produtos, infelizmente, tendem a ficar restritos a grupos mais politizados. O desabamento do Rana Plaza, em Bangladesh, em 2013, matando mais de 300 operários que trabalhavam em condições precárias nas India produzindo roupas para badaladas grifes internacionais, provocou uma onda de críticas e chamados a boicotes contra as marcas envolvida, que permanecem todas no topo do mundo fashion. No Brasil, para falar de casos mais recentes, as redes Zara e Marisa passaram praticamente incólumes diante das denúncias de trabalho escravo na sua cadeia de suprimentos.

Em geral, a percepção do consumidor nem sempre reflete preocupações dos analistas e pessoas que pensam politicamente correto. A Parmalat foi protagonista de um dos maiores escândalos na indústria alimentícia e o seu fundador, Calisto Tanzi, condenado há 17 anos de prisão por causa de falcatruas que deixaram um rombo de 14 bilhões de euro, mas a marca continua viva, inclusive no Brasil.

No atual chamado ao boicote contra as marcas da JBS há de se considerar o quanto a movimento pode estar contaminado pela polarização política que vive o pais. A forma como o grupo alimentou um grupo de corruptos com gordas propinas ao longo de anos é motivo para indignação de sobra. Mas é necessário verificar se o clamor contra a empresa tem a ver exclusivamente com sua conduta antiética ou porque a associam com este ou aquele partido. Tomara estejamos a caminho de um exercício pleno de cidadania com capacidade para mobilizar consumidores num engajamento contra todo tipo de abuso de qualquer empresa. Até lá, porém, pode ser que Friboi seja mais lembrado como boi de corte do que com boicote, e que muitas das discussões iradas contra os irmãos Batistas sejam em torno de churrascos com carnes fornecidas por seus frigoríficos.

Valdeci Verdelho